terça-feira, 15 de setembro de 2009

O Povo que Sabe Mas Não Sabe

Passam, muitas vezes, despercebidas por nós todos, certas demonstrações enormes, mas sutis, de sabedoria popular. Muitas pessoas sabem muito mais do que acham que sabem. Seria isso algo bom? Ou não se auto-conhecer, nesse caso, seria algo absurdamente frustrante? Vou citar alguns exemplos para que possamos refletir na gravidade desse possível problema.

Por uma falta de acesso à educação formal e à instalações próprias para o ensino e a pesquisa, muitas pessoas do interior de nosso país e pelas áreas mais remotas do mundo inteiro, acabam não notando o conhecimento quando este o é transmitido. Quando se ouve que se esquentando água com uma tal erva mergulhada e a bebermos, essa água suja morna ajudará em males como febre, colesterol, dor de cabeça e inúmeros outros, não questionamos. Nem deveríamos. Pois quem um dia descobriu isso (pesquisa científica) e descobriu que isso ajudava contra "n" males (ciência) acabou por aplicar o conhecimento, sem mesmo notar.

Amigo meu de Rondônia (Arthur) presenteia eu e nossos colegas na faculdade com inúmeras frases não só irreverentes, como também inteligentes. "Mais grosso que papel de embrulhar prego" é uma dessas metáforas que ouvimos todos os dias. Interessante é saber que não só frases divertidas saem de nossas pessoas regularmente. Os ditados populares (ou provérbios, para os cultos) que o digam. "Juramento de quem ama não dá pra crer", já dizia minha vovó. Apesar de muitos serem óbvios, só o são porque descrevem acontecimentos baseados na observação, o puro método da pesquisa científica (claro, mais simplificado).

Outra coisa que é legal de observar é filósofos saindo de condições nas quais não imaginaríamos que essa seria uma ocupação comum. João Guimarães Rosa é a pessoa mais apta a falar desse assunto que existiu. Riobaldo, personagem e narrador do colossal "Grande Sertão: Veredas", é o sertanejo mais profundo, talvez por ter sido um dos poucos que analisamos de perto, que já pisou nas terras do interior de Minas. Sem as rédeas da norma culta, se expressa melhor do que a grande maioria dos poetas que o mundo já viu, com frases simples, mas extremamente densas. "Viver é negócio muito perigoso..." é a minha frase favorita do romance.

Sem querer incluir meu amigo Arthur na categoria dos sábios sem acesso à educação formal (muito pelo contrário, sendo que ele está na UTFPR comigo, me deixando para trás muitas vezes), mas ele, mesmo sem muita profundidade no estudo de filosofia, apareceu com uma pérola esses dias, sem nem perceber: "Nunca é um tempo muito próximo."

Sem entrar muito no mérito da frase, que poderia me prender por um post inteiro maior que esse (grande, não?) já percebemos que não carecemos de um estudo realmente avançado sobre coisas que provavelmente não nos ajudariam muito. Basta nos virarmos, conversarmos com pessoas diversas para enriquecermos nossas vidas de uma maneira, digamos, natural, artesanal, rústica.

É, eu não diria que saber sem saber que sabe é um problema. Talvez, quem sabe, possamos chamar isso de uma confortável ignorância dos inteligentes.

Um comentário:

  1. As vezes o mergulho filosófico de vocês me parece causado pelo turbilhão hormonal da flor da juventude. Em muitas situações me reconheço no pensamento desse grupo e me contento que a essência do não conformismo ainda vive - talvez não mais em mim, mas em novas gerações.

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