quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

O Triste Fim do Conhecimento Sensível

Já percebeu que hoje as coisas precisam ser abstratas e difíceis para que possam ser respeitadas? A reta tornou-se inviável, mesmo sendo o caminho mais curto para ligar dois pontos, o simples é visto como suspeito. Para que algo possua credibilidade faz-se necessário um aval científico. Não basta ser conhecimento para que seja valorizado, é preciso ser ciência.

Merleau-Ponty já falava da falta de animalidade do conhecimento moderno. O mais triste disso tudo é que ainda colhemos os frutos da produção científica da modernidade: objetivismo, distanciamento do observador e seu objeto de estudo, imparcialidade. Para que algo seja considerado ciência, é necessário que seja previsível e calculável, Weber mesmo já dizia isso. Assim, as outras fontes como a sabedoria popular e o conhecimento sensível foram desvalorizadas. E vamos e venhamos, não existe nada mais hipócrita do que uma teoria bem fundada. Na prática, ela nunca será a mesma. Ela foi criada a partir das idéias de uma pessoa só! Como as outras devem reagir da mesma forma frente a uma única cadeia de raciocínio, sendo que não possuem as mesmas experiências de vida, a mesma bagagem educacional, o mesmo conjunto emocional e até a mesma forma de recepcionar o conhecimento?

Se existe algo insólito é o conhecimento: não há como obtermos uma verdade absoluta. Cada um absorve uma assertiva de sua determinada maneira. A teoria é importante, e isso não podemos negar. Mas nem mesmo a teoria, com todo o seu alto nível de abstração, está livre de relativismos. Olhe a física, a gente aprende de um jeito fácil no Ensino Médio: os sistemas são todos constantes, massa e energia se conservam, etc. Ingenuidades à parte, sabemos que não é assim na realidade "sólida". Afinal, o que aconteceu com o conhecimento sensível?! Ele é tão desprezado hoje. Temos métodos e macetes para chegarmos a uma conclusão comum. Mesmo a ciência tendo evoluído muito desde a Modernidade, mesmo depois da Teoria da Relatividade de Einstein, temos resquícios desse positivismo científico, que reina, mesmo que não absoluto, até os dias de hoje.

Precisamos de complexos procedimentos para ter acesso a determinados direitos, de instrumentos mil para nos localizarmos no tempo e espaço. O conhecimento tornou-se cada vez mais técnico, mais hermético, é preciso compartilhar todo aquele jargão científico para poder ter acesso às informações. As antigas discussões filosóficas hoje se resumem a discussões técnico-procedimentais, graças a essa herança moderna, de modo operacional e acadêmico. O Antigo conhecimento era lido da natureza e percebido juntamente com o conhecimento sensível, de modo a formar uma ordem, e o homem era mais submerso a essa lógica.

Veja os Quares, eles se localizam no deserto sem ajuda de nada, somente com o posicionamento das estrelas, mesmo com as dunas mudando de lugar constantemente. A percepção que o homem tinha da realidade era muito maior. Nós não temos mais percepção. A passagem desse concreto para o abstrato criou um nível de, justamente, abstração do conhecimento que nos distancia profundamente da realidade. Isso vai repercutir, no século XX, em prejuízos militares. A guerra do Vietnã, por exemplo. Os Estados Unidos levaram um couro porque não tinham conhecimento sensível do território. O vietcongue sabia trafegar alí, sabia se localizar naquela selva como ninguém. Ele sabia diferenciar uma coisa da outra, sabia onde estava andando. As tropas americanas, urbanas, viam a selva como algo desconhecido, não tinham a agilidade, o conhecimento que o outro lado tinha, a percepção. Aquilo que víamos nos filmes de faroeste, o cara colocando o ouvido na terra, sabendo se passou alguém por ali, a quanto tempo. Essa capacidade de conhecimento perceptivo é algo que o homem moderno perdeu profundamente.

Nosso conhecimento é maciçamente abstrato, técnico. Essa percepção não temos mais. O homem que era chamado a CONHECER essa realidade, conhecer pela percepção do mundo, agora é chamado a manifestar sua vontade, a QUERER. Somos vítimas da razão instrumental, da ciência: sem toda essa parafernália, não conseguimos ver um futuro sustentável.

2 comentários:

  1. Mínia, não acha que para sobrevivermos com as máquinas que facilitam nossas vidas precisamos do conhecimento técnico? Olhe, esse também pode ser adquirido na prática! Quantos profissionais, operários por aí aprenderam sem nenhum curso a operar maquinários complexos?

    E a ciência, pelo menos as partes dela que usamos para entender o universo, é absurdamente complexa. Não tem escapatória! O próprio objeto de estudo dela é um caos absoluto! Acho que não é exagero dos cientistas deixar tudo complexo, é que, para nos aproximarmos mais da realidade (que é um organismo vivo, caótico, dinâmico) precisamos criar um instrumento tão complexo quanto possível.

    Minha opinião, talvez apenas um apelo de um cara que se dá bem em exatas. Mas garanto que, apesar de ser de mais difícil apreensão, a matemática e a física, por exemplo, usadas pelos cientistas realmente têm mais acurácia do que uma fórmulinha tida como lei (erroneamente), tipo F=m.a.

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  2. O motivo de o ser humano ter se distânciado da natureza é histórico, a partir do momento q ele se vê obrigado a morar nas cidades, como houve na inglaterra com a lei do cercamento. Isso é realmente triste e necessário, triste poir é notável a falta da "aisthesis" no ser, pois ele se tornou tão sistemático e calculista muito pq o tempo na sociedade capistalista nos obriga a comer rapidamente, a falar rapidamente e trabalhar rapidamente e por isso pouca gente consegue saborear a comida e não apenas comê-la como máquinas. E tbm o ócio-q é necessário para o descanso do corpo- é esquecido, eu conheço muitas pessoas q não conseguem ficar um momento sem trabalhar ou fazer alguma coisa pq as outras pessoas vão pensar q a pessoa é uma vagabunda, claro q isso ta na cabeça dela e não tem como tirar. Mesmo eu não consigo ficar muito tempo sem ler alguma resvista...
    E se for ver como a internet, a Tv, entre outros meios de comunicação, vêm bombardeando imformações nas pessoas, da pra entender o porquê deles não procurarem conhecer por si e sei lá ter um conhecimento empírico.
    Trazer essa sensibilidade de volta às pessoas é muito difícil mas não impossível. ;)

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